LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – A Aliança Democrática (AD), coligação de partidos da direita tradicional que venceu as eleições legislativas em Portugal, falhou em seu primeiro teste no Parlamento: a eleição do presidente da Casa, o terceiro posto mais importante da República portuguesa.
A situação mostra que o futuro governo de Luís Montenegro, que toma posse em 2 de abril, deve encontrar resistências para aprovar seus projetos entre os deputados. A coalizão tem apenas dois assentos a mais do que o Partido Socialista (PS), que sai do governo para se tornar oposição.
Sem o apoio da legenda de ultradireita Chega, a AD só conseguiu desbloquear a aprovação de seu indicado à presidência no segundo dia de tentativas, após fechar um acordo que prevê a partilha da liderança com os socialistas. O arranjo prevê uma solução intermediária em que a direita estará no comando nos dois primeiros anos da legislatura, dando lugar a um socialista na metade final do mandato.
Líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias afirmou que esse modelo permitiu “acabar com um impasse que degrada a imagem das instituições”. Para ele, “esta é uma solução politicamente possível entre duas instituições e entre cavalheiros”.
Apesar do acordo, os socialistas reafirmaram que não darão sustentação parlamentar à coligação de direita. “Nada altera a condição do PS como força política que lidera a oposição”, disse Dias.
Os novos parlamentares assumiram seus cargos na terça-feira (26) em uma sessão prevista para ser essencialmente burocrática, com a eleição para posições diretivas no Parlamento, incluindo a presidência e as vice-presidências.
Desde a campanha, o líder da Aliança Democrática, Luís Montenegro, agora nomeado primeiro-ministro, afirmou que não pretendia governar com o apoio do Chega. A frase “não é não”, repetida pelo social-democrata sobre o assunto, virou uma espécie de bordão entre os portugueses para falar sobre a exclusão do partido populista dos arranjos.
No entanto, governar sem o apoio da ultradireita, atualmente a terceira maior força na Assembleia da República, está se provando um desafio antes mesmo do início oficial da liderança de Montenegro.
Na última segunda-feira (25), o líder do Chega, o deputado André Ventura, afirmou que seu partido havia chegado a um entendimento com a coligação de direita para as eleições do Parlamento. Essa informação foi posteriormente negada pela AD.
Ventura então passou a atacar a aliança. Amparado pelo poderio de sua bancada de 50 deputados, o líder do Chega comandou um teste de forças no primeiro dia dos trabalhos legislativos, impedindo a aprovação do nome proposto pela direita tradicional para a presidência da Casa.
Sem a ultradireita, na primeira rodada de votações, José Pedro Aguiar-Branco, do Partido Social Democrata (PSD), o maior da coligação AD, só conseguiu 88 dos 116 votos necessários para chegar ao cargo.
No meio da confusão e com o embaraço da derrota, o PSD chegou a retirar a candidatura, mas acabou voltando atrás. Após o fracasso da primeira tentativa, o Partido Socialista então decidiu apresentar um nome alternativo: o deputado Francisco Assis, que rapidamente angariou o apoio das demais legendas de esquerda.
O Chega seguiu o exemplo e também teve uma candidata à presidência, a deputada Manuela Tender, que não foi apoiada por nenhum outro partido.
Após três rodadas, por volta das 23h no horário local, nenhum dos candidatos havia obtido os votos necessários. A sessão foi interrompida, sendo retomada apenas nesta quarta. O impasse só foi resolvido após o acordo entre a AD e os socialistas, que garantiu os votos necessários a Aguiar-Branco.
O entendimento com a esquerda desagradou o líder do Chega. “Hoje muda todo o contexto; hoje o Chega assume-se como líder da oposição”, disse Ventura. “No primeiro Parlamento em muitos anos em que há maioria de direita, o PSD escolhe fazer um acordo à esquerda. A minha recomendação então a partir de agora é que o PSD procure junto do PS os consensos necessários para as matérias de governo.”
O acordo entre PS e AD também foi alvo de críticas à esquerda. O secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), Paulo Raimundo, afirmou que sua sigla não irá colaborar com arranjos “em nome de um suposto combate à direita”. Segundo ele, o pacto acertado para a presidência “só favorece a direita”.
Montenegro apresentará formalmente os nomes de seu governo ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, nesta quinta-feira (28). Embora a legislatura tenha duração de quatro anos, analistas não descartam a convocação de eleições antecipadas por conta da frágil base parlamentar da coligação. Pela legislação lusa, um novo pleito só poderia ser convocado a partir de novembro, passados seis meses desde o anterior.
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